Solidão, essa grande companheira das horas vagas
(imagem de Polina Sirotina)
Que melhor altura para falar sobre solidão, do que esta? Muitos de nós vivemos sozinhos e podemos sentir-nos particularmente solitários nesta altura de confinamento e isolamento social. E, embora haja pessoas que não se sentem particularmente sozinhas, há outras que sim. Por isso, vamos falar um pouco sobre este tema hoje.
O ser humano é um ser social. Precisamos de interagir com outras pessoas, mesmo que sejam coisas pequenas: com o homem da mercearia, do café, dos correios... Precisamos de contacto humano e de um espaço social onde nos sentimos incluidos. Mas, por vezes, isso não acontece e sentimo-nos sozinhos. Porque há uma diferença entre estar e sentir: o estarmos sozinhos não significa que estejamos solitários. Há pessoas que vivem bem assim, que não se sentem sozinhas apesar de estarem sozinhas. E há pessoas que vivem acompanhadas e que se sentem sozinhas pelas mais variadas razões.
Mas será a solidão um problema de saúde mental? Não, mas ambas estão ligadas. Por um lado, a solidão pode exacerbar problemas como a ansiedade e a depressão. Por outro, o ter uma doença mental pode fazer com que nos sintamos sozinhos. A solidão pode provocar, ainda, problemas a nível da auto-estima, dificuldade em dormir e aumento de stress, o que depois acaba por se tornar num ciclo vicioso de sentimentos negativos do qual parece que não conseguimos sair. A solidão está associada, também, a um maior risco de se sofrer de várias doenças psiquiátricas, como a depressão, o abuso de substâncias, Alzheimer, mas também a várias outras doenças, como a diabetes, doenças cardíacas, hipertensão e obesidade.
Calma! Se vocês se sentem assim, não significa obrigatoriamente que vão sofrer disto tudo!
A solidão também parece estar associada a pessoas que se encaixam em determinados grupos, como por exemplo: pessoas que não têm família nem amigos; pais e mães solteiros; pessoas que cortaram, por algum motivo, relações familiares; pessoas que sofrem algum tipo de descriminação, seja mental, física, sexual, racial, religiosa ou outra; pessoas em situação de pobreza e que, por isso, são excluídas de certas actividades sociais; vítimas de negligência e abuso sexual, uma vez que lhes será mais difícil estabelecer relações próximas com outras pessoas; pessoas que mudam muitas vezes de casa ou de escola.
O que é a solidão, então? É quando as nossas necessidades sociais não são cumpridas. É quando queremos uma ligação emocional com alguém e não a temos. É quando queremos e precisamos de contacto social e não o alcançamos. É quando uma relação se desmorona e caímos no vazio deixado por aquela pessoa. É quando as paredes nos gritam aos ouvidos no silêncio da noite, e mais ninguém ouve a não sermos nós. Para mim, a solidão é isto e às vezes não consigo fugir dela.
É normal sentirmo-nos sozinhos de tempos a tempos e perante determinadas situações da vida. Quando saí de casa para viver sozinha, essa solidão era mais marcante, mas aprendi a viver com ela e a conseguir contorná-la a maior parte das vezes. Como? Falando comigo, interiormente, de forma a reconhecer essa solidão, essa carência, essa tristeza, percebendo qual é a origem, aceitá-la, nunca me culpando nem caindo no registo de auto-comiseração, e pondo-me o mais confortável possível para ela passar. E fazer o que me apetecesse. Se fosse chorar durante meia hora, chorava. Se fosse ver televisão da treta, que fosse. O dia todo. Ler, fazer a catarse através da música, escrever, procurar artigos na net sobre o tema para perceber que não sou a única assim e que isto é mais comum do que se pensa. A partir do momento em que este sistema está enraizado, a coisa torna-se mais fácil. Não, a solidão não deixou de aparecer. Mas agora, em vez de ficar assustada, convido-a para entrar, beber um chá e comer umas bolachas, ela fica o tempo que for preciso comigo a ver as Kardashians na tv e depois vai-se embora. E sinto até que sai mais fortalecida destes momentos, porque fico a conhecer-me melhor, porque os enfrento sem medos e fico a saber do que sou capaz. E isso é impagável, meus caros.
Nestes dias atípicos que estamos a viver, ficar em casa tem sido um consolo, confesso. Adoro estar em casa a ouvir música e a ler, a fazer as coisas ao meu ritmo. Até o trabalho me corre melhor! Mas confesso que não ver, presencialmente, as pessoas de quem gosto é muito estranho. Falo todos os dias com a família e com amigos, mas não estar com ninguém, estar isolada nesse sentido, é muito estranho. E fez-me perceber a falta que nos fazem as pessoas. Os seus corpos, a sua energia, as suas vozes, os seus trejeitos típicos. Mas esta é uma fase que acredito que vamos ultrapassar e que vai ficar tudo bem.
Nos entretantos... Olhem, nos entretantos vou escrevendo por aqui, vou falando convosco através do podcast. Afinal, estamos sozinhos juntos.