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Psico Coisas

Saúde Mental | Vida de Solteira | Filmes | Livros | Memes | Já disse saúde mental?

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17 de Junho, 2019

O meu "eu" com menos 15 anos, em papel

D.M.

Sempre gostei de escrever e tenho diários desde pequena. Alguns já os perdi, provavelmente foram para o lixo numa qualquer arrumação de tralha lá por casa, mas outros tenho comigo. Trouxe-os, aliás, quando vim morar sozinha - estão todos dentro de uma caixa que guarda cadernos onde escrevia textos meus, poemas, letras de música que gosto, ideias, os meus pensamentos e emoções. O caderno mais antigo que aqui tenho de escritos meus data do ano de 2004. 2004!! Quinze anos da minha vida por escrito dentro de uma caixa tão preciosa para mim e que encerra tantos segredos daqueles que não me conhecem assim tão bem - e mesmo aqueles que conhecem, chorariam se lessem o que lá tenho escrito.

 

Como já aqui referi, quando fui diagnosticada com Personalidade Borderline (TPB) e contei à minha melhor amiga, a coisa não correu assim tão bem. Ela não percebeu, não aceitou e não "concorda" com este transtorno porque, segundo ela, "tudo é relativo". Desde então não contei a mais ninguém e, mesmo com ela, tenho-me mantido mais recolhida, guardo muito mais para mim desde essa altura. E, apesar de o diagnóstico ter sido libertador e me ter feito tão bem porque, finalmente, consigo dar um nome e uma razão ao que vou sentindo, a reacção dela força-me a justificar para mim mesma este diagnóstico. Insegurança, procura de validação, incerteza, ansiedade - sim, é tudo isto e mais. Mas hoje, motivada por uma investigadora no centro de investigação onde trabalho que está a fazer um trabalho sobre literatura ligada à memória, fui pegar nesses meus diários, nesses pedaços de mim em papel.

 

E se eu precisava de uma validação ou racionalização do meu diagnóstico, já não preciso.

 

Está ali tudo, desde 2004 e muito provavelmente desde antes também. As descrições de mim própria como alguém emocionalmente instável, carente, deprimida e ansiosa, ora com raiva de tudo e todos, ora com um vazio emocional brutal que tentava calar cortando-me, ou tentando não sucumbir a esse comportamento por via da escrita, ou com vontade de o fazer, mas, de alguma forma, conseguindo não ceder - e sempre perguntando a mim própria "porquê?". Sempre este sentimento de incompreensão, de que as coisas não encaixavam, de alguém que nunca esteve confortável na sua própria pele. Sempre tive uma noção de mim própria como alguém que experienciava turbilhões emocionais que, muitas vezes, nem tinham razão aparente de ser. Sempre senti muito à flor da pele e tudo muito intensamente. SEMPRE. Não foi desde há meia dúzia de meses. 

 

Quando li algumas partes destes diários tive vontade de os levar e mostrar a essa minha amiga e dizer-lhe "agora diz-me se tudo é relativo e se a minha personalidade não corresponde a este diagnóstico". Mas depois pensei que não vale a pena. Para meu bem, não vale a pena. É uma pena, sinceramente, que as pessoas não percebam o que eu sou e a infinita capacidade que eu tenho para amar. Nunca vão conseguir perceber aquilo que abarco, a profundidade mental, emocional, intelectual que encerro. Mas ainda quero acreditar que hei-de ter alguém na minha vida que me reconheça, que me aceite e acarinhe de verdade. Que me veja em todas estas vertentes e que demonstre o seu apreço por mim precisamente por causa do TPB e não apesar dele.

 

Se calhar estou a ser injusta com as pessoas que estão na minha vida, mas de facto elas não me sentem da mesma forma que eu as sinto a elas. E isso não é culpa de ninguém, a vida é assim mesmo. Há dias mais fáceis de aceitar isso, há dias mais difíceis em que tudo me vai parecer uma injustiça tremenda, onde vai parecer que estou a falhar, em que me quero fechar para sempre, em que me quero diminuir só para ter uma migalha daquilo que preciso. Mas agora sei o que é o TPB. Agora tenho consciência disso e posso agir. E às vezes o agir é fazer, precisamente, nada.

 

Por isso, escrevam. Escrevam em diários, em blogs, em guardanapos, no telemóvel, onde for. Expressem-se de alguma forma, deitem cá para fora os monstros que vos atormentam e matem-nos aos poucos. Para vosso bem, para tornar o vosso fardo mais leve. Cantem, pintem, tirem fotografias, desenhem, façam caminhadas, toquem um instrumento. Essa energia precisa ser libertada e que forma melhor se não a transformação dela em algo bom, com significado? Para vocês.

 

Isto é para vocês.